Popularizadas através de artistas como Beyoncé, Rihanna e Ludmilla, as perucas e apliques sintéticos hoje fazem a cabeça e os negócios de muita gente - seja na periferia, seja nos bairros nobres

Empreendedoras apostam no mercado de cabelos artificiais


Popularizadas através de artistas como Beyoncé, Rihanna e Ludmilla, as perucas e apliques sintéticos hoje fazem a cabeça e os negócios de muita gente - seja na periferia, seja nos bairros nobres

Muitas meninas que já foram reféns das químicas e dos alisamentos hoje passam pela aceitação das madeixas naturais. Durante o processo de transição, um expressivo número delas busca aplicações de cabelos artificiais e tranças. Com uma variedade de cores, texturas, tamanhos e formas é possível mudar o visual com mais frequência - e sem submeter os fios a produtos agressivos. E quem desbrava esse mercado está se dando bem.
Muitas meninas que já foram reféns das químicas e dos alisamentos hoje passam pela aceitação das madeixas naturais. Durante o processo de transição, um expressivo número delas busca aplicações de cabelos artificiais e tranças. Com uma variedade de cores, texturas, tamanhos e formas é possível mudar o visual com mais frequência - e sem submeter os fios a produtos agressivos. E quem desbrava esse mercado está se dando bem.
Amanda Jesus, 28 anos, já trabalhou como auxiliar de serviços gerais. Agora, é dona do Mulher de Fibra, espaço que recebe clientes nos fundos de sua casa, no bairro Restinga, em Porto Alegre. Demorou até ela se render ao dom que muito está ligado à cultura afro e à criação.
Ela percebeu a oportunidade do negócio neste mercado há cerca de um ano, quando trabalhava em um salão de beleza com aplicações de Mega Hair.
"Eu tirava um valor muito baixo no final do mês, porque o cabelo humano é muito caro e tinha pouca procura", comenta ela. O alongamento com cabelo natural saía a partir de R$ 800,00. O artificial, por sua vez, ficava em torno de R$ 400,00. A ideia de trabalhar com as fibras veio após uma experiência pessoal.
Amanda era usuária do alongamento natural, até passar por um constrangimento, causado por um produto durante a aplicação. A jovem perdeu cabelo em algumas regiões da cabeça. Em meio à situação, percebeu que a alternativa era menos invasiva.
Os modelos artificiais podem ser sintéticos ou orgânicos. A diferença entre as duas versões é que o sintético não pode ser lavado frequentemente e é sensível ao calor, ao contrário do orgânico. "Quando coloquei minha primeira fibra, de início, fiquei com receio de ser criticada por estar usando cabelo sintético", lembra Amanda.
Muita gente, no entanto, começou a procurá-la para copiar o estilo. A partir disso, em junho de 2016, virou empreendedora, com um investimento inicial de cerca de R$ 2 mil.
Hoje, mais duas pessoas a ajudam a dar conta da demanda. Uma delas é Karol Dutra, 22 anos, trancista do salão.
Karol aprendeu a trançar quando tinha apenas 11 anos. Ela trabalha com todos os tipos de tranças, boxbraids, desenhadas, rasta, entre outras. "Quando eu era menor, trançava minha irmã e minhas primas, mas nunca vi como trabalho. Eu não gostava de trançar, tinha até vergonha", comenta. Mas isso mudou. "Eu amo o que faço, não me imagino fazendo outra coisa", afirma. E isso se reflete no movimento: por dia, são atendidas de seis a oito meninas no local. Às vezes, fazendo as profissionais virarem a madrugada.
Os cabelos usados no Mulher de Fibra vêm de uma fábrica em Juiz de Fora, Minas Gerais. E, se a cliente comprar o cabelo por conta própria, o salão também realiza só a aplicação ou trança. A mão de obra fica em torno de R$ 150,00. Com o produto incluso, sai por R$ 300,00.
Para março, a agenda já está quase lotada, consequência dos desfiles das escolas de samba que acontecerão no fim do mês. "Muitas meninas que desfilam em algumas escolas aqui de Porto Alegre e até de Canoas nos procuraram", conta. E o público não se restringe só a Porto Alegre e Região Metropolitana: o salão atende clientes de Arroio dos Ratos, Pelotas, São Gabriel, Capão da Canoa, entre outras cidades.
"Eu fui obrigada a contratar uma contadora fixa para me ajudar a administrar o negócio", comenta Amanda.
As duas entendem que o cabelo é algo que mexe muito com a autoestima. "Eu já perdi as contas de quantas mulheres apareceram aqui chorando e depois me mandam mensagens agradecendo pelo trabalho. E isso é muito gratificante", expõe Amanda.

Site especializado em perucas mira público afro

Após passar cinco anos na África, a Relações Públicas Leticia Carolina Korndorfer, 40 anos, decidiu que abriria um salão especializado em cabelos afro na cidade em que reside, Uberlândia, em Minas Gerais. "Quando voltei para cá, percebi que a metade da população da cidade em que eu moro é negra, mas, ao mesmo tempo, não tinha sua beleza valorizada", comenta ela.
Leticia teve de ir até os Estados Unidos para especializar-se nos crespos, capacitação que não encontrou por aqui. O que não esperava é que lá encontraria um mercado tão forte de perucas. Após conhecer a dona de uma das maiores lojas do setor nos Estados Unidos, viu a possibilidade de fazer isso no Brasil. "Inicialmente, eu não quis, porque tinha ido para o exterior para me especializar em cabelos afro, e tinha o projeto de ter um salão voltado para isso", lembra ela.
Em fevereiro de 2015, inaugurou a Tress Cabelos, uma das maiores lojas virtuais de perucas no Brasil. No site, são comercializados cabelos artificiais e perucas. O público-alvo são as mulheres negras.
A plataforma, que vende para todo o Brasil, tem como principais clientes os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
A loja virtual vende de 200 a 550 perucas por mês. No ano de 2016, a Tress Cabelos teve um crescimento de 10% ao mês, com faturamento mensal de R$ 100 mil a R$ 120 mil. As perucas vendidas no site custam entre R$ 200,00 e R$ 500,00, e a loja conta com cerca de 5 mil clientes, inclusive personalidades famosas.
"A (atriz) Thaís Araujo usa as nossas perucas nas capas de revista, e a (cantora) Ludmilla está usando também uma peruca nossa no encarte do último álbum dela", destaca.
 

Cabeleira versátil é para quem pode

"Em 2010, eu morava nos Estados Unidos e tinha o cabelo bem loiro. Com a água de lá, fiquei com o cabelo verde. Fui até uma loja e comprei dois apliques: uma franja e um rabo de cavalo", diz Susan Dietz, 42 anos, dona da HD Perucas. Hoje, ela detém os contratos exclusivos no Brasil das marcas
norte-americanas Revlon, Rachel Welch, Eva Gabor e Christie Brinkley, e distribui para Curitiba, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Brasília. "A gente é líder no mercado. Há outras marcas, mas com padrão mais baixo", revela Susan. Ela começou com 10 modelos, em casa. As importações foram aumentando, até que, em 2014, abriu a primeira loja em Porto Alegre, na avenida Nilo Peçanha, nº 730, e uma em São Paulo, no bairro Higienópolis. Na capital gaúcha, há também uma filial na rua Padre Chagas, nº 347, no bairro Moinhos de Vento.
"Fiquei interessada em trazer para o Brasil porque aqui não tinha nada parecido em termos de qualidade", ela conta, sobre o fio que imita cabelo humano da maioria das perucas que comercializa. "Ele não é tão pesado, portanto não esquenta tanto. Além disso, não sofre com os efeitos do tempo, como o cabelo natural", sintetiza. Estas perucas custam entre R$ 399,00 e R$ 2.500,00.
As de cabelo humano arrancam em R$ 2.200,00. Os modelos importados levam 30 dias para serem feitos. O que sai caro, segundo Susan, é o tipo de construção, que é como a trama é elaborada para comportar os fios e garantir conforto. Cerca de 70% do consumo da HD Perucas é por vaidade, aponta. "Quem usa não para de usar, é como roupa", diz ela, que inclusive atualiza o estoque a cada coleção nova das fornecedoras - e possui cerca de 10 perucas para uso próprio. Os demais clientes procuram por causa de patologias e falhas no couro cabeludo.
"A vaidosa compra toda hora, quer modelos diferentes. Quem tem alguma patologia compra uma ou duas", explicita. A faixa etária de clientes varia de 35 a 80 anos. Muitas delas querem ter o mesmo cabelo que tinham em outras fases da vida. Outras buscam pela praticidade de "estar sempre pronta" ao vestir a cabeleira postiça.
Isso também gera, além dos apliques, a proliferação de produtos para homens, como maquiagem com fibra de algodão para disfarçar a rarefação do couro cabeludo ou da barba e próteses capilares feitas com colagem (a exemplo das que eram usadas pelo empresário Eike Batista antes de ter sido preso).
Mas manter essa frequência de consumo é também um desafio. "A gente tem que divulgar muito, senão as pessoas não se aproximam", diz. Para isso, a marca mantém um quadro na TV Urbana e faz aproximações em hospitais e clínicas. A cada outubro, a empresa doa 10 modelos para instituições de apoio a pacientes com câncer de mama.

A solução encontrada nas tranças

Karen Aguiar, 19 anos, achou, no meio das tranças, uma solução para a falta de dinheiro e uma distração para os problemas que, desde cedo, teve de enfrentar.
Há cerca de um ano, saiu de um abrigo onde ela e seus quatro irmãos foram criados, na zona Sul de Porto Alegre. E, como não tinha emprego fixo quando deixou a instituição, passou a trabalhar com as tranças de lã - que são uma alternativa para quem não quer gastar muito.
A jovem começou aplicando em si e na sua irmã mais nova, e logo mais pessoas passaram a se interessar pelo trabalho. "A cada menina que eu trançava, tirava uma foto e postava no Facebook. Ou as meninas postavam e me marcavam. Assim, mais gente começou a me chamar", comenta ela.
O álbum de fotos na rede social pessoal de Karen virou um portfólio. Ela atende a domicílio e trabalha com um preço fixo de R$ 100,00. O material é por conta da cliente - cada novelo de lã sai em torno de R$ 3,00. Os atendimentos ocorrem em Porto Alegre e na Região Metropolitana.