Empresas que têm a possibilidade de entrar no mercado norte-americano colocam a decisão na balança

Empreendedores dizem que Miami não significa solução para crise brasileira


Empresas que têm a possibilidade de entrar no mercado norte-americano colocam a decisão na balança

As crises política e econômica do Brasil têm gerado, desde 2015, debates e reações diversas entre os empreendedores. Há quem pense que sair do País e se mandar para Miami seja a melhor solução. Será?
As crises política e econômica do Brasil têm gerado, desde 2015, debates e reações diversas entre os empreendedores. Há quem pense que sair do País e se mandar para Miami seja a melhor solução. Será?
A paranaense Daniela Toniolo, 34 anos, responsável pela Courotec, em Porto Alegre, teve de refletir sobre essa decisão. A empresa, que pertence a sua família e tem faturamento de R$ 6 milhões ao ano, foi convidada a abrir uma filial na cidade norte-americana.
O ramo em que atua, com produção de bancos de couro para automóveis, aviões e mobílias, teria um futuro promissor nos Estados Unidos. Na Flórida, muitas casas ficam próximas a lagos, atraindo investimento nos móveis das varandas. "Eles priorizam este conforto. Mercado existe", diz Daniela, que tem dois filhos e está à espera do terceiro.
O que a faz pensar duas vezes antes de arrumar as malas é o próprio cenário brasileiro. "Nossa energia está voltada ao mercado nacional quase que com foco de sobrevivência, onde temos de reavaliar processos diariamente. O mercado principal para nós é aqui, por isso demos uma segurada nesse projeto", expõe, ressaltando que, caso abra mesmo uma unidade estrangeira, "será um complemento, não uma solução".
Ter um negócio em outro país não é uma alternativa simples ou milagrosa, já que exige tempo e pesquisa para conhecer as características do público. Além disso, a produção precisa ser feita no novo território. "O consumidor visa prazos. A agilidade é fator essencial", considera Daniela, que, se colocar a ideia em prática, terá de implantar uma fábrica local.
A empreendedora tem cidadania europeia, o que facilitaria os processos. Segundo ela, o investimento em capital e o número de contratações obrigatórias é menor para europeus - se comparado aos empresários brasileiros imigrantes.
Fundada em 1996, a Courotec tem 50 funcionários na Capital, sendo três haitianos. Foi a companhia quem fez as três últimas reformas nas poltronas do avião presidencial.
Com toda essa bagagem, Daniela destaca que não é momento para se aventurar. "Não é ano para ganhar dinheiro. É ano para sobreviver. Depois que passar, quem sabe, pensamos em Miami", repete.

'Não estamos trocando o Brasil pelos Estados Unidos'

Bernardo Thomaz, 55, se convenceu de que pode apostar no mercado norte-americano. O passo, no entanto, representa expansão e não fuga. "Não estamos trocando o Brasil pelos Estados Unidos. Achamos apenas que é um mercado importante para esse momento que se vive", diz o fundador da Bella Gula, que planeja abrir uma unidade de sua tortaria em Miami ou Orlando em março de 2017. A decisão não partiu de uma vontade do empreendedor de sair de sua terra. Tanto que só vai morar no país caso ninguém mais envolvido no projeto se disponha.
Há 23 anos no mercado, a marca neste momento tem 32 lojas espalhadas em cinco estados (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Distrito Federal) e faz um trabalho de pesquisa e avaliação de interessados dispostos a se unirem à empreitada. "Adotamos o caminho de captar 10 investidores para fazer isso acontecer com sociedade por cotas", expõe Thomas, deixando o convite em aberto. A seleção se dará neste mês.
Antes de bater o martelo pelos Estados Unidos, a intenção era levar a marca ao Nordeste. A crise, porém, gerou a troca do destino. "Foi uma oportunidade. Se não fosse isso, expandiria Brasil afora." A Bella Gula, em 2015, registrou crescimento de 14,9% no faturamento, com a cifra de R$ 27 milhões. Por isso, a empresa não desacredita no potencial verde-amarelo.
Sobre a operação estrangeira, Thomaz destaca o diferencial de um produto saudável e ressalta que a possível escolha por Miami não tem relação com o fato de a população de brasileiros ser grande na região. "Não queremos fazer um negócio para brasileiros, mas para americanos", avisa. O empreendedor abriu sua primeira unidade no Bourbon Shopping Assis Brasil e já foi dono de cinco lojas. Hoje, tem duas: a do Bourbon Ipiranga e a de Atlântida. As demais são franquias.
 

Case de sucesso não tomou decisão de uma hora pra outra

Uma das empresas brasileiras que servem de exemplo bem-sucedido nos Estados Unidos é o Giraffas. Sua ida à Miami, no entanto, não foi de uma hora para outra, no impulso. A rede de fast food começou a estudar o mercado norte-americano de alimentação em 2006 e, somente em 2011, inaugurou sua primeira loja na Flórida. Ou seja, foram cinco anos de pesquisas.
A rede aposta no tradicional arroz e feijão e no corte de carne mais conhecido no Brasil, a picanha. No segundo semestre de 2014, começou a transferir parte dos restaurantes próprios para as mãos de franqueados. Naquele país, o Giraffas emprega 160 pessoas.
Em 2015, foi eleito entre as 10 marcas brasileiras mais internacionalizadas, segundo ranking da Fundação Dom Cabral. A operação da marca nos Estados Unidos cresceu 18% em 2015, comparado ao ano de 2014.
Agora, a rede pretende consolidar a marca para expandir por meio do sistema de franquias e também de lojas próprias a partir deste ano. O objetivo é atingir 50 unidades norte-americanas em até cinco anos.

>> Para os investimentos

O visto EB-5 é aquele que pode dar direito ao green card. Até o final de setembro, as pessoas que investirem US$ 500 mil em projetos pré-aprovados pelo governo norte-americano, ou para o desenvolvimento da própria empresa nos Estados Unidos, podem ter a concessão da autorização para ficar no local em cerca de 18 meses. A partir de outubro, o valor do investimento para esse programa vai para cerca de US$ 800 mil.
 

Abrir ou expandir uma franquia nos Estados Unidos

Conforme a Associação Brasileira de Franchising (ABF), há 37 marcas brasileiras nos Estados Unidos. Pelo mundo, o principal segmento com unidades físicas é o de Alimentação, com 18% de participação.Claudio Tieghi, diretor de Inteligência de Mercado e Relacionamento da associação, diz que o cuidado no exterior deve ser redobrado. "Primeiro, é preciso se adaptar como cidadão e entender a dinâmica do país. Depois, (entender) a própria lei de franquia, que nos Estados Unidos é dividida por estado, diferente do Brasil, onde há uma lei federal", detalha. 

>> Você sabia?

A Associação Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) tem um escritório em Miami desde 2004 - o segundo do País fica em São Francisco. Dentro das empresas que utilizam os serviços do escritório estão companhias cujo modelo de negócio é de franquias. Empresas incubadas têm acesso a serviços como o escritório físico, escritório virtual, assessoria, missões prospectivas e de negócios, pesquisa de mercados e projetos de promoção com foco nas exportações. A Apex-Brasil tem, ainda, um projeto setorial em parceria com a Associação Brasileira de Franchising (ABF). Há possibilidade de as empresas do setor utilizarem os serviços pagando uma tarifa mensal.