Imagine como deve ser estar no comando de uma empresa familiar, com três gerações de história, 1.800 funcionários, 19 lojas - dentre elas, a maior livraria do País, em São Paulo, com 4.300 m² - e, ainda por cima, lidar com todas as pontas de um negócio em crescimento acelerado.
Essa é a função de Sergio Herz, 44 anos, desde 2011. Ele é neto de Eva Herz, fundadora da Livraria Cultura, e CEO do empreendimento, que tem uma unidade em Porto Alegre, no Bourbon Country.
Por telefone, tivemos uma conversa aberta com Herz, que, sem muitas reservas, relevou um pouco do que é a rotina e os desafios de ocupar uma posição dessas. Segundo ele, o mais difícil da gestão é "a solidão do cargo".
Geração E - Como você lida com o fato de, por estar na posição de chefia, ser modelo das pessoas o tempo inteiro?
Sergio Herz - Na verdade, talvez haja um estereótipo que criam de presidente de empresa. Eu tento me colocar numa posição em que também falho. Vou fazer besteira, não sou melhor que ninguém. E eu estou ali com um objetivo, que é gerar valor para a empresa. Como a gente gera valor para a empresa? Através de venda e agradando o cliente. Ponto. Este é o meu objetivo e eu vou brigar sempre por isso. Às vezes, brigo de maneira certa, às vezes de maneira errada. E é difícil acertar com todo mundo. Eu procuro respeitar as pessoas do jeito que elas são, não gosto de fazer pré-julgamentos, porque acho que ninguém tem que ser do jeito que eu gostaria. Da mesma forma, as pessoas têm de me aceitar como sou. Isso é uma parte bastante importante de lidar com pessoas e alivia este peso que você me perguntou. Eu posso estar brigando ou cobrando, mas eu não estarei ali por picuinha, e sim pelo objetivo da empresa. E isso esvazia qualquer outra coisa.
GE - Então, quais os maiores desafios de ser presidente de empresa?
Herz - O que acho o pior de você ser exemplo é a solidão do cargo. Você chama alguém para almoçar - usando o exemplo mais bobo, a pessoa não vai dizer não. Ninguém vai dizer "pô, não estou afim de almoçar com você hoje". Se você chama para tomar um café, a pessoa não vai porque está com vontade. Aliás, pode até ser que sim, mas na maioria das vezes ela vai porque você é o chefe dela. Porque você tem o poder de uma caneta. E isso é perceptível, isso acontece porque é do ser humano. As pessoas infelizmente não falam tudo o que elas querem para você porque você está numa posição de poder. Por isso que é solitário. E você tem pressão por todos os lados. Este, acho, é o principal problema de todo presidente de empresa, não estou falando só de mim. É a solidão de tomar decisões que só você pode tomar. Tudo isso faz parte do jogo. Para mim, esta é a parte mais difícil.
GE - E no andar deste processo de expansão, você escorregou em algum momento?
Herz - Tiveram várias coisas que eu errei. A Cultura é uma empresa que vem de uma administração familiar para uma transformação em empresa profissional. E nessa questão de profissionalizar, por mais que tenha contratado um time maravilhoso e competente, esse time não tinha a nossa cultura, coisas importantes que a gente tinha, próprias da livraria. Neste processo, a gente pode perder algumas coisas. Então, tive que dar um passo atrás, dois, e rever a maneira como estava fazendo as coisas. E aí começar de novo e trabalhar muito mais essa questão de cultura da empresa. Eu achava que a questão cultural, de referência, de DNA, era transmitida de um jeito mais fácil. E não é.
GE - Pode exemplificar um pouco?
Herz - Se uma pessoa vê um problema na sua área, ela não vai falar direto com você, vai falar com o seu chefe e vai deixar que ele tome providências. Se eu ver algo, eu vou falar com você na hora e depois vou falar com o seu chefe. Entende? Esse meu contato direto, às vezes, incomoda quem está no comando. Só que o dono não espera, não está aí para estas coisas. Eu vou falar com o meu gerente para ele tomar uma atitude se eu posso falar direto com você? Falo direto.